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Como se entreter durante um passeio de elevador
Assunto é uma coisa que nunca faltou para mim. Num elevador , numa fila de banco ou dentro de um ônibus. É melhor falar alguma coisa do que ficar olhando para o infinito com fisionomia de glúteos. Mas como, se esses invólucros de dejetos que compartilham o mesmo planeta que a gente são tão distintos daquilo que nós, com tanto esforço e criatividade, definimos como sentido de nossas vazias vidas? Boa pergunta, nego. Eu é que não quero correr o risco de ouvir que o deus, para quem rezei uma gama de dúzias de padre nossos e outra porrada de baciadas de ave marias, segundo o Ilustríssimo Filósofo de Boteco Mané da Silva, tem apenas a ínfima probabilidade de 7,15% de existir. Aí não. Não quero. É muito esforço para poucas chances de conseguir o meu tão sonhado cantinho vip numa confortável nuvem branca com ar-condicionado, numa região de alta classe do Paraíso Celeste, que eu sempre sonhei. Mas isso é fácil de evitar. Basta nos restringirmos a temas dotados de menos seriedade, como: hoje vai chover; Hermes e Tereza são presos pela Polícia Federal ao chegarem ao Rio de Janeiro; Dr. Pellini descreveu sabiamente as características de uma vulva saudável; Denise Rocha e Andressa Urach brigam na fazenda; etc. Sem, é claro, recorrer a temas apelativos como: Herson Capri caminha pela orla do Leblon. Mas, tio, e se o cara disser que o Gilberto Barros é um excelente animador de auditório? Devo conversar com ele mesmo assim? Meu querido sobrinho, quase ninguém é chato, porque somos nós que conduzimos a conversa. O bicho só é chato mesmo se desenha aspas no ar com as mãos enquanto fala. Aí pode bater. Até o momento, já temos uma parte do problema resolvida, mas e quanto ao coeficiente de inteligência? Como podemos saber quais são as áreas de interesse do nosso misterioso interlocutor, para que iniciemos um diálogo passa-tempo? Isso é mais fácil do que ter a certeza que milhares de homens pudorosos, assim como eu, olham para o teto toda vez que o senhor Jô Soares entra no palco de terno branco, sapato bicolor e gravata borboleta vermelha, fazendo cara de prostituta e rebolando, com o dedinho da mão esquerda em riste. Basta perguntarmos, educadamente, qual é o seu coeficiente de inteligência. Se ele responder que é 182, pergunte quanto ele acha que será a distância percorria por um píon, antes de seu decaimento, se este mesmo píon se desloca pela atmosfera terrestre e sua velocidade é 0,99c, sendo sua vida média de 26 ns. Agora, se o prezado amigo descartável for mais humilde e tiver apenas 156 de coeficiente de inteligência, indague acerca de sua crença na previsão de que o Produto Interno Bruto brasileiro crescerá em 2014, após o leve recuo nos últimos meses de 2013. Pode ser, entretanto, que o nível intelectual da televisãozinha humana seja menor, como uns 124, mais ou menos. Aí, um bom papo ecológico sobre a viabilidade de conservação de 560 mil quilômetros quadrados da Amazônia até 2015 seria uma boa pedida. E se, por ventura, a massa encefálica do indivíduo for bem mais próxima do que costuma ter o homem médio? Uns 118. Fácil! É só falar sobre a polêmica declaração de Bruno Mazzeo sobre Roger Moreira e sua decadente carreira, emaranhando o intelectualóide bate-papo com saborosas opiniões sobre os contra-ataques do músico, dizendo que o humorista terá sorte se o seu nome for mais do que uma nota na história de Chico Anysio. E uma imensa quantidade de conversas ao vento podem ser introduzidas conforme as variâncias da dispersão de miolos contidos na caixa craniana do sujeitinho, podendo-se chegar ao extremo de serem parcos 75 de coeficiente. Aí, meu amigo, é hora de abrir aquele sorrisão e dizer: Não diga! E o que você achou do Alexandre Pato ter dito que ficou parado no ataque porque o Mano Menezes mandou? Não chega a ser uma diversão daquelas fazer isso, mas dá pra se distrair um pouco. Não é um prazer sexual. É um prazerzinho bem filho da puta, eu diria. Está vendo, meu caro? Silêncio nunca mais.

Mingau Ácido (Marcelo Garbine)
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Ilustração de Nanci Penna

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